23 abril 2007
Viver melhor em São Paulo
1. NO TRANSPORTE COLETIVO
Diante do trânsito infernal que o paulistano enfrenta todo santo dia, usar mais o transporte coletivo seria, no mínimo, uma medida sensata. Mas é só quando se adota esta medida sensata que a gente consegue perceber o quanto a falta de civilidade no transporte coletivo vai além da velha questão de respeitar os lugares especiais, cedendo-os a quem de direito. Aliás, a própria existência de lugares especiais já é sintoma evidente de que alguma coisa não vai nada bem.
Embora a Vejinha não tenha abordado este ângulo da questão, posso assegurar que, além de ceder lugar a idosos, mulheres grávidas, pessoas portando crianças de colo e deficientes, é de bom tom:
Não fazer lanches ou refeicões em trens ou ônibus urbanos.
Eu sei que muitas vezes o percurso é longo e que todos tentamos aproveitar o tempo da melhor maneira possível. Mas, convenhamos, alternar o uso das mãos entre um pacote de salgadinhos de bacon e os bancos, anteparos, corrimãos e balaústres de um ônibus ou vagão é coisa bem longe de ser bonita ou minimamente higiênica. A devoradora dos salgadinhos que usei como exemplo viajou em pé e bem ao meu lado, na quinta-feira passada. Fui obrigada a ouvir o roc-roc e a atestar a qualidade daquele malfadado aromatizante artificial por pelo menos 30 minutos, que foi o tempo necessário para que umas 25 pessoas descessem e eu conseguisse, finalmente, ir um pouco mais pra trás.
Só que a coisa não pára por aí, pois em outras ocasiões já tive oportunidade de ver gente comendo de tudo dentro do ônibus e do metrô. De hambúguer com maionese a espetinho de filé miáu. De sorvete de casquinha a sanduíche natural. E quase tudo isso devidamente acompanhado por uma latinha ou copo de refrigerante que, ao final da refeição, costuma acabar no meio do asfalto ao lado dos papéis, caixas, canudinhos e guardanapos que também restaram dela.
Mas note: antes de jogar esse tipo de lixo pela janela, em geral o passageiro devorador espera o veículo parar e solta tudo bem rente à janela, na esperança de não atingir ninguém. Sinal de que talvez exista uma tendência, ainda que longínqua, de preocupação com os outros e com a própria educação.
Sentar-se na posição correta.
Parece que virou moda: ultimamente, as pessoas que tomam trem ou ônibus juntas, mas não conseguem se sentar juntas, deram de sentar-se de lado para poder continuar a conversa. Assim, acomodam-se com as pernas no meio do corredor e a lateral do corpo apoiada no encosto, e se comportam como se os demais passageiros é que estivessem atrapalhando.
Tirar as mochilas das costas.
Usar mochila é tão prático que muitas pessoas de todas as idades simplesmente se esquecem de que estão com elas nas costas ao entrar num ônibus ou num trem. A mochila nem precisa ser grande para constituir um obstáculo respeitável, mesmo que não seja hora do rush. Isso sem falar nas agressões involuntárias que ocorrem cada vez que o mochileiro se move em qualquer direção. Pode parecer incrível, mas o uso da mochila no transporte coletivo me incomoda muito mais do que alguém que atende ao celular no elevador.
2. AO CELULAR
E por falar em atender ao celular no elevador, confesso que isso não me irrita nem um pouquinho, perto do que se costuma fazer em outras situações.
Em trânsito
Todos sabem que falar ao celular enquanto se dirige um automóvel ou motocicleta é proibido. Mas poucos sabem que, além de proibido, é bastante perigoso. Talvez por isso tantas pessoas simplesmente instalem seu insulfilmzinho e, protegidas do olhar do guarda, continuem fazendo as duas coisas ao mesmo tempo sem admitir as barbeiragens que cometem no decorrer da conversa.
Mas não é exatamente deste trânsito que eu quero falar, até porque já existe legislação sobre ele. Eu quero falar dos percursos que as pessoas fazem à pé, falando ao celular. Pode ser na rua, nos corredores dos shoppings mais elegantes, dentro de um estacionamento ou repartição pública: você já reparou que quem está falando ao celular nem vê direito onde pisa? Isso quando não está andando bem na sua frente e pára, de repente, só para atender a uma ligação.
Mas isso, por incrível que pareça, não é o pior.
Em público
O pior é quando a pessoa está numa loja, restaurante ou até mesmo na fila do banco e decide entabular uma longa e íntima conversa bem ali, no seu ouvido. Uma vez, na fila do caixa da Fnac, ouvi uma mulher descrever em detalhes o resultado do seu Papanicolau, que acabara de sair. E eu, que só queria pagar e sair correndo, acabei por saber nome e sobrenome de todos os fungos e bactérias que se haviam hospedado no útero dela. E isso não é invenção minha, não.
Concordo que atender ao celular durante um encontro de amigos ou de negócios não é a coisa mais agradável do mundo. Mas, antes de sair condenando quem o faz - e sem direito a defesa - procuro me lembrar de que nem todo mundo que usa celular é adolescente, está de folga ou está em férias. Ou seja: a ligação pode, sim, ser importante. Ou você acha justo, por exemplo, classificar aquela mãe que recebe uma ligação da babá como “indivíduo que ajuda a piorar a vida na cidade”?
Sendo assim, só costumo classificar o ato como falta de civilidade quando a conversa prossegue, mesmo sem ter importância. Ou quando uma reunião de negócios é interrompida inúmeras vezes por ligações referentes a outros negócios.
Pra mim, reunião de trabalho, cinema, teatro e museu são lugares de celular desligado. Para os outros - e conforme o caso - acredito que haja perdão. Até mesmo o elevador.
3. NOS BARES, RESTAURANTES, EXPOSIÇÕES...
Muito se fala sobre os lugares que admitem ou não admitem animais de estimação, e quais são os limites que se deve respeitar para não incomodar ninguém. Nada mais correto.
O que me causa estranheza é o fato de não se falar sobre limites com aqueles pais que arrastam os filhos pequenos para qualquer lugar, causando um terrível incômodo às próprias crianças e, em conseqüência, para todos os demais.
Não vou falar dos pequenos que correm em volta de garçons carregados de bandejas, enquanto seus pais conversam sem pressa numa mesa de restaurante ou de bar. E não vou falar porque, apesar do perigo evidente e da possível irritação que a correria e os gritos possam causar aos demais clientes, esses pequenos não me parecem, em nada, incomodados. Mas vou falar dos pais deles, sim. Ou melhor: acho que nem deles preciso falar, porque estou certa de que você já entendeu tudo, testemunhou alguns casos e já teve muitas oportunidades de formar opinião.
Pra mim, lembrar aquele caso em que visitei uma exposição de arte antiga desviando por cerca de uma hora e meia de uma pequena turba ensandecida, já é mais do que suficiente. Se você não conhece essa história, é só clicar: Criança sofre!
Por hoje é só, pessoal!
03 abril 2007
1º de abril
Eu havia lido sobre as obras e realmente esperava que elas me desafiassem os sentidos. Só que ali, frente a frente com elas, a única coisa que senti de verdade foi uma forte impressão de que, a qualquer momento, alguém surgiria “do ralo” revelando uma câmera escondida e me dizendo que eu estava no “topa tudo por dinheiro” ou que era 1º de abril.
Pode me chamar de anta ignorante ou de desprovida de sensibilidade artística. Talvez eu mereça, de fato.
Em compensação...
Por mais que alguns reclamem, existem verdades na Lei Cidade Limpa que não se pode negar:
1. Num espaço em que todos os elementos são criados para ter o maior destaque possível, a única coisa que realmente aparece é uma enorme confusão. Se você ainda não se convenceu disso, abra uma página de classificados de qualquer jornal.
2. Em termos de comunicação, não há nada mais democrático. Afinal, até as menores fachadas estarão em pé de igualdade com o grande magazine ao lado. Agora cá entre nós: antes dessa Lei, será que elas tinham mesmo alguma chance de aparecer?
3. Uma cidade mais bonita é um lugar infinitamente melhor para viver.
Só há um porém: com São Paulo ressurgindo das placas, naturalmente as pichações saltarão ainda mais aos olhos e passarão a incomodar até a quem já não as via mais. Será, finalmente, que vai aparecer uma solução que não agrida ainda mais os pobres donos ou usuários dos imóveis pichados?
Mas falta um detalhe de suma importância:
Banheiros públicos espalhados pela cidade.
Gente, eu já trabalhei no centro, já circulei bastante pelo centro, mas nunca senti um cheiro de xixi tão forte e constante - e por uma área tão extensa - como nessa caminhada de ontem.
Sou fã nº 1 da limpeza visual, mas falta de banheiro numa cidade como esta já é questão de saúde pública. E se ainda não é, em breve será. Acredite.
Sejamos francos: não é todo mundo que tem coragem de pedir ou que consegue autorização para usar o banheiro de algum estabelecimento da região. Aliás, os estabelecimentos da região não têm obrigação nenhuma de arcar com os custos de água e limpeza de banheiros, a não ser para o uso dos seus funcionários e clientes.
E quem trabalha como ambulante? E quem vive nas ruas? E quem não tem uma moedinha para usar as instalações sanitárias de um Shopping Light, por exemplo?
Toda essa gente também tem necessidades fisiológicas, muitas vezes inadiáveis, e estou certa de que, se tivesse opção, escolheria fazer o seu xixizinho e até mesmo o nº 2 em instalações mais discretas e adequadas. Mas como não há opção, o jeito é dar um jeito.
E por falar em dar um jeito, você já tentou descer aquela escadaria que leva do Viaduto do Chá ao Anhangabaú, bem ao lado do Shopping Light? Ontem eu tentei, mas uma imensa barreira de xixi se interpôs no meu caminho e foi impossível atravessá-la sem uma máscara de oxigênio e botas especiais.
Foi assim que a maior instalação do Anish Kapoor - que estava lá embaixo - ficou sem a minha visita. O que demonstra que a falta de banheiros públicos é, inclusive, um obstáculo físico importante entre o cidadão comum e a obra arte.
E aqui cabe um questionamento: será que foi por causa disso que eu não consegui entender nada do que vi na exposição? Só quem teve nariz, estômago e (sobretudo) cérebro poderá responder.